domingo, 27 de março de 2022

MAS O QUE É A ARTE - Conceitos racionais sobre o indefinível.














 Mas o que é a arte? O que a difere da realidade? Por que  sentimos a real     necessidade de produzi-la, admirá-la, de criticá-la ou enquadrá-la entre as molduras de   padrões   estéticos formais? Talvez, e já discordando de certos olhares críticos lançados por Tolstoi, a arte seja para  muitos  o  que  há  de  belo,  ou  quem  sabe  seja  uma  fórmula  firmada sob pressões aristotélicas atemporais, tendo como base as oscilações do olhar.

Propulsora e libertária, difícil é defini-la! A arte na sua realidade nos cede possibilidades e traz na essência subjetiva e sinestésica um espírito encantador capaz de incitar paixões e transfigurar cotidianos. Talvez por isso seja tão difícil firmar definições que satisfaçam a seus simples admiradores ou fervorosos críticos. Para ela certamente não há uma verdade única, não há realidade cética que a oprima ou rotule. Os questionamentos acerca do seu conceito são muitos e certamente as respostas para a sua amplitude são bem mais numerosas do que pensa a nossa vã filosofia.

Não sei. Há tempos quando em meus devaneios observava pinturas renascentistas deparei-me com Rembrandt e o seu “Boi Esquartejado”. Causou-me estranhamento a beleza exposta entre o sangue, as vísceras e a morte em tons pastéis. Seria essa a essência da arte? A imagem captada de um cotidiano ficou em mim como se tinta fresca, viscosa, tal qual a carne bela/feia e antiestética exposta entre molduras pelo pintor. Certamente fora ali deixada com objetivos bem maiores que a minha simples percepção pôde captar.

Talvez esteja aí a questão: captamos a arte ou ela é quem nos laça, nos encarcera? Outro dia, preso frente a uma obra de Benê Olivier, artista plástico residente em Porto Seguro, vi-me diante dessa inquietante dúvida. Havia entre os estranhos traços das faces cortes que em muito fustigaram o meu olhar. Algo entre o cotidiano exposto e uma atualidade significativa capaz de envolver, de seduzir. A arte a arrebatar, propondo em outro plano uma empatia. O momento recriado longe das caricaturas estereotipadas ou de foto-pinturas tão comuns nas galerias espalhadas pelas ruas da cidade. Não que nestas não haja valores ou beleza. Todavia, nas cores e nas formas expostas na arte de Benê, há uma aproximação entre olhar espectador e o instante original da obra, capaz de recriar conceitos. Para muitos: a verdadeira essência de toda arte!

Mas ser essência decididamente não é ser real. A arte se redefine sob visões subjetivas em momentos distintos, como uma força propulsora do ser humano em sua essência. É uma arma libertária junto a qual vagueia utópica e iludida a liberdade do ver e do criar. Tomemos como exemplo os corvos de Van Gogh, aqueles que para muitos voam livres sobre o trigal; mas que verdadeiramente vivem presos às paredes entre molduras e tempo, à espera de um olhar para criticá-los e assim ganhar o mundo. Uma cruel realidade!

Entretanto para a arte o que vem a ser real? Como então entendê-la, criticá-la ou simplesmente apreciá-la? Afirma Tolstoi: “A arte é um órgão da vida humana, transmitindo a percepção racional dos homens para o campo dos sentimentos”. É sinestésica! Capaz de definir e redefinir em cada momento o seu sentido lógico em um sentido próprio, inerente em seu primeiro plano a cada criador e a posterior às diversas visões espectadoras. É também o que planeja ser dentro de cada processo individual, o que a confere um caráter único e transitório que ultrapassa as fronteiras do conhecimento.

Publicado em 12 de março de 2013 em  Cítrica. - FUNCEB - Fundação Cultural do Estado da Bahia.